Galáxia

Tenho-me um pouco menos nesta manhã.

Um pouco menos, nestes dias. Galáxia.

Uma tenda improvisada. Nossa vida inteira.

Meia vida minha. E nem sei de numerais.

Não sei mais.

Nem menos. Não multiplico.

Divido a dúvida.

Quem nos fez contar?

Penso um pouco nisso, nesta manhã.

Nas contas. Nos números.

E em mim.

Nesta manhã, eis todo o ser.

Estar.

Galáxia.

Aqui


Aqui não é o mesmo lugar;
Aqui não é o melhor lugar;
Nem sei aonde fica...
Aqui.

Nem sei aonde fico;
Em qualquer lugar;
Entre o êxtase;
E o escuro.

Aquele lugar chamado adeus.

Aqui não é meu lugar;
Aqui não é teu lugar;
Não há sinal de nós dois...
Aqui.

Nem sei aonde ficas;
Em nenhum lugar;
Perto das rotas;
Longe de mim.

Aquele lugar chamado não mais.

Estive ausente daqui, minha casa;
Estive fora daqui, minha carne;
Em instanstes parti, partirei;
E é para cá que não volto, voltei.

Nas mãos, uma única mala.

E, nela, levo aqui.

Que não é meu lugar.

Um dia desses.

Hora de renascer


Deixa assim. Deixa estar... Melhor.
Tudo bem aqui. Trancafiado. É mais seguro.
Sem deixar resíduo nenhum. Nenhuma marca a mais.
Pra consolar quem está por... Fora.
Não há explicação nenhuma a dar.

Hora de renascer. Hora de repensar;
Esse silêncio não é pra você. Nem pra ninguém mais.

Honestidade já não basta.
Nem é a questão. Pois fui sincero, mas nunca intenso.
E o que resta, daí, é alguém que nem pode reclamar.
Quando quis atenção... Não soube trocar. Retribuir...

Hora de renascer. Hora de repensar;
Esse silêncio não é pra você. Nem pra ninguém mais.

 Quem pede presença, deve presentear
 A quem teme a carência, uma sala de estar.
(Estar).

Hora de renascer. Hora de repensar;
Esse silêncio não é pra você. Nem pra ninguém mais.

Canção. Uma década e pouco atrás.

Cena 34


Interna - Loft bagunçado, às escuras - Noite
Três sujeitos sem importância. Conscientes dessa falta de importância no grande "organograma das coisas". Sem sutilezas. Apenas constatação. Frieza inoxidável.

CARA 1
Cansei de procurar. Porra... FUDEU.
CARA 3
Velho... CALA A BOCA. Um segundo, ok? Um segundo.

O CARA 2 apenas gesticula, com o pensamento a quilômetros.

CARA 1
Porra, meu... PORRA, MEU. Morremos!
CARA 3
Filho de uma PUTA. Costura a boca.

Há um balcão amontoado de tralhas. Restos de brinquedos retrô. Velhos utensílios colegiais. Papéis. Um relógio quebrado chama a atenção. Os ponteiros, parados, marcam 14h15min. Entre os ponteiros, na face do relógio, algo rabiscado.

CARA 1
Eu vou... TÁ? Eu vou.

O CARA 3 range os dentes. Um animal atiçado por um chicote curto. Rosnando. Pronto ao ataque...
O CARA 2 ficara quieto e permanecera contido. Não dissera nada. Mas, súbito, retesa e estica o corpo. Altivo! Resoluto.

CARA 2
FUDEU! Fudeu, sim.

Alguns segundos...

CARA 2
Morremos! Fudeu. Não adianta! Eu vi uma garrafa de tinto ali em cima. Olha... ALI.

Ele aponta para uma prateleira desordenada a uns 30 metros.

CARA 2
Abre esse troço. Não tem mais nada.

O CARA 3, sem maior poder de reação, apenas segue a diretriz. Rolha arrebentada. Sons de asas, aos milhares. Goles. Direto na boca da garrafa. Asas intermináveis. Goles tensos. Calmos, sem explicação. Os três caras sem importância. Um bom Pinot Noir. Mais goles. Asas. A garrafa vai de mão em mão.

No relógio quebrado, entre os ponteiros, manuscrito: ACABOU.

Um último gole. Escuro.

Lá pelos idos de 2015.

Somos todos tormenta


A voz gutural;
Desse céu tempestuoso;
Nasce aqui;
Na mesa da sala;
No teclado;
Na pia do banheiro;
À beira da calçada.

Somos todos tormenta.
Conosco, ela tenta;
Sem ela... nós? Nada.

Outra gota que chega;
Charco em pleno asfalto;
Nossos olhos;
Ali no canto;
Na esquina;
Dobradiça rangendo;
Carne, osso e lamaçal.

Somos todos tormenta.
Que cai, corre e arrebenta.
É vida. É hoje. E é letal.

Foge uma folha;
Mil galhos desabam;
Nuvens e sal;
Rodopios sem fim;
Rei vendaval;
Só temos paredes;
Só temos telhado.

Somos todos tormenta.
E ela nem esquenta.
Fim. Prazo encerrado.

Somos todos tormenta;
O topo é igual à raiz;
Somos todos tormenta;
"Faz frio, fecha a porta";
Somos todos tormenta;
"Só o tempo é que diz";
Somos todos tormenta;
Porque não importa.

Não importa.

Maio de 2018

Vinte vezes


Algumas dores lombares recorrentes.
São pontadas no flanco. Às vezes irradiam o abdômen. Inúmeros momentos não me deixam dormir. Latentes e crônicas. Não me pertencem.
Sou brasileiro, sem plano de saúde, e sem a tenacidade do desespero.
Apenas perplexo com a crueldade do ser. A tirania do estar.
Fugacidade aleatória dessa DNA dança. Vontades corroídas. Desejos pela metade.
Eu já morri umas vinte vezes. Em pensamento. Na covardia.
Mas tenho em mim a dor das ausências. Até flertei com a frieza. Salpiquei um beijo na descrença.
No outro dia de sol, ardência. Perdas. Saudades. E o medo incisivo.
De ainda estar vivo.
Não merecer.
Estar aqui.
Melhor seria não.
Seria covardia.
Vinte vezes em pensamento.
A vida segue.
E as dores assustam...

Maio de 2018

Isso é mentira


Havia algo no teu sorriso;
Na tua presença, nesse teu todo;
Que eu quis para mim;
Que eu precisei;
Uma equação, um elemento;
Uma partícula. Uma reação.
Para essa mentira que sou.

E isso é mentira.

Ontem é mentira;
Quaisquer ontens são;
Mentira.
A verdade é o calor.
É suor. É salgada.
É a dor necessária.

E isso é mentira.

Pensei nisso uns segundos atrás.
Mas o tempo. AH! O tempo...

...não tem piedade.

Mentira.

Nova canção - 19 de agosto de 2017.